segunda-feira, 5 de julho de 2010

Reclama, menina!


Estava evitando, mas carecia vir aqui deixar um rastro. Meu intento aqui seria de me sonegar, mas sei que acabarei sendo capturada. Tenho sido mais transparente do que me agrada, do que posso sustentar. Sou de me adulterar em explicações, mas ultimamente tá arriscado – quanto mais me escondo, mais me deixo ver. Hoje me consinto sem culpas: preciso me dizer, me escrever, me confessar. Mas vai ser mais um texto confuso-contraditório, se prepare.
Não sinto saudade nenhuma da última vez que tive raiva de mim, mas procurei modos de sentir de novo. Se houvesse em minha testa um botão "retroceder", esse só não estaria tão gasto se existisse também um "reiniciar". Tô tomando gosto por essa coisa de fazer burrada só pra garantir o remorso. E me sentindo usada pelos meus abusos de quem acha que tem arsenal suficiente pra sobreviver a cada queda. Decepções não só engordam como também matam.
E senti uma morte estranha de ontem pra hoje, neguei um pedaço de mim tão profundo, tão meu, que apanhei sequenciadamente pra me penitenciar por isso. Fiz uma cicatriz no corpo, que é pra jamais esquecer de ouvir sempre - e invariavelmente - o coração. Um corpo marcado assume que não é bom conselheiro.
Confesso que tô aqui pra maldizer muito, pra reclamar e gritar descontentamento em cada trecho e me berrar na cara que ta foda sustentar essa babaquice de ser diferente. E tô virada porque ninguém quis escrever sobre o que eu tô sentindo, pra me isentar de ter que me arrancar essa coisa toda daqui de dentro. Me arrasei, me arrasei mesmo e tô com raiva do mundo porque não tô afim de aturar essa culpa toda sozinha. Me talhei ao meio pra deixar entrar um alguém que não era eu. Desejei mudar de gente, quis ser outra confiando nessa coisa de que só vivemos coisas novas quando fazemos coisas novas. E como isso dói. Como arde essa coisa de abrir avenidas dentro de mim, de enxertar pedaços que nunca me pertenceram. Me desrespeitei e borrei minha marcha até perder o rumo. Nessas horas, me reconhecer fica obscuro.
– Agora fica ai, mocinha. Fica bancando a tal super-qualquercoisa, com ares de heroína que nem sabe o que tá querendo defender! – Gritou alguém aqui de dentro.
Tem horas que a cabeça diz, com certa maldade: "Tá vendo que eu avisei?". E eu tenho que ouvir silente. O sorriso amarelado do coração dispensa respostas, assevera que eu não tenho sido muito bacana com o que tenho de mim.
Fiquei enodoada, impregnada por um cheiro de culpa que assassina qualquer prazer. Queria um dia me sentir menos criminal, ser a tal vítima que todo mundo curte assumir pra si, ser palerma, tipo ingênua, corrompida, atacada, afetada. "Coitada de mim, fui assaltada pelo destino!".
Mas reclama, menina. Reclama sim. Assim que se cospe as agonias, assim que podemos olhá-las nos olhos. Todo mundo precisa encarar seus fantasmas para poder expulsá-los. Vou vomitar aqui, porque esse é o único lugar onde eu posso me incriminar e voltar pro dia-a-dia com cara de “tudo igual”.
E esses dias eu detestei muito essa coisa de carregar a vida nas costas e levá-la pra onde quiser, nessa lógica de que somos nós que fazemos tudo acontecer. Um dia leviana e eu viveria a paz – ou não.
Mas eu continuo, com todas as arestas obscuras, eu continuo. Me alargar, mais do que preciso, é condição humana para sobreviver a esse mundo hora insano, hora fascinante, que sabe muito bem como confundir aqueles que acomodam-se alheios à si próprio.

Texto: Carina Mota

Um comentário:

E aqui, qualquer carinho é bem-vindo =D