domingo, 30 de maio de 2010

Resto de quem não sou.


Não me reconheço mais. Me olho no espelho e tento achar um traço daquela mulher que me fazia bem, daquela de quem eu gostava, do "eu" que eu curtia ser.
Ter você na minha vida foi atravessar um longo e árduo processo de desindentificação - se é que existe esse termo. Tentando te conquistar eu fui tantas, fui mulheres tão diferentes, buscando encontrar em mim algo que pudesse te ganhar de vez. Brinquei de personagens dos mais diversos, por hora me diverti com muitos, mas também me machuquei por me forçar a barra tantas vezes. Fui do doce ao amargo, tentando achar o ponto certo pra te agradar. Me fiz de forte, me fiz de frágil, de todos os modos fui mulher pra você.
Estudando suas queixas, sabia que não era em mim que estava o erro, mas quis o consertar ainda assim. Fui a mulher centrada, que resiste à essa coisa tola de brincar de amor. Fui a mulher passional, que dá a cara ao tapa quando quer conquistar um homem. Fui a desencanada, moderninha, que assume seus desejos e não se faz dependente. Fui também aquela cheia de coragem pra dizer "eu te amo" nos momentos mais improváveis, mais inconstantes de nós dois.
Fui a mulher de te garantir uma vida e aquela de negar pedido de casamento. Fui a mulher que desejou teu filho e te negou esse sonho. Fui a mulher que se derretia em seus braços, que chorou de emoção num beijo tão esperado. Fui a mulher que te esqueceu e te fez lembrar de mim. Fui a mulher dos inúmeros não's, dos infinitos sim's. Fui a mulher mais dura e seca e que te odiava como ninguém. Fui a mulher mais doce e dedicada, e de todas esta foi a mais odiada por mim, pois toda vez que ela aparecia, vinha com toda vontade de ficar. E essa era a que mais sofria por ter que ir embora e ceder o lugar pra alguma mulher qualquer, magoada, ferida, ressentida de ainda te amar. Fui tantas pra não te perder, que me perdi entre elas. E de todas as mulheres que fui, nenhuma conseguiu te prender os olhos.
Depois de tantos endereços, de tão diferentes 'personalidades', de pular de canto em canto procurando um alguém em mim que pudesse te laçar o peito, hoje não sei mais quem sou. Não consigo encontrar a mulher que posso ser pra qualquer outro homem. E ainda me misturo com as tantas que te fui, e me perco sem saber onde eu termino, onde elas começam. Parece que ainda tento te ganhar nos outros.
E essa miscelância de mulheres, de faces estranhas e tão presas a mim, me reparte em dezenas e eu me dissolvo sem força. E disso jamais te perdoarei. Disso, garanto, jamais te perdoarei. Buscando você, perdi meu caminho. Agora não sei mais pra onde ir. Essas tantas mulheres nascidas pra você te clamam de volta e eu, sozinha entre tantas, tento resistir. E me faço de cega, me faço de surda e emburreço nesses clamores suicidas. Tento aos poucos ir me libertando desses rostos, me perdendo um pouco em cada uma. Mas não quero mais continuar aqui, alimentando mulheres mortas, assassinadas por você, acumulando um resto de quem eu não sou. Abandoná-las a cada passo é como abandonar você. E te deixar pra trás é o único modo de me trazer de volta, de caminhar rumo a quem eu realmente sou.

Texto: Carina Mota

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